Trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão, em Santa Catarina, a caminho de casa

Florianópolis - Os mais de 30 trabalhadores resgatados em condições análogas à de escravo em Rancho Queimado, na região serrana de Santa Catarina, já estão a caminho de casa. Eles deixaram Florianópolis na madrugada desta quinta-feira, após mutirão de Auditores-Fiscais com a presença do Procurador do Trabalho Rosivaldo da Cunha Oliveira, na sede do Ministério do Trabalho, onde foi feito o registro das contas para depósito dos salários que devem ser creditados em até 24 horas, a baixa nas Carteiras de Trabalho e o preenchimento das guias para a retirada do seguro-desemprego.

Os procedimentos foram acordados no Termo de Ajuste de Conduta (TAC) nº 073/2018 assinado com o Ministério Público do Trabalho na semana passada, após o resgate com as empresas Thenosflorestal Infraestrutura e Logística Florestal e a Construflora Serviços Ltda, subcontratada da primeira e responsável por arregimentar os trabalhadores para a extração de madeira de pinus.

Pelo TAC a Thenosflorestal assumiu a obrigação de pagar um  salário de R$ 2.000,00 (dois mil reais) à cada trabalhador, sendo R$ 1.500,00 no ato da baixa das carteiras de trabalho e o restante, R$ 500,00 (quinhentos reais) parcela residual a propósito do pagamento das verbas rescisórias, que serão homologadas no dia 16 de maio nas sedes do Ministério do Trabalho das cidades de origem dos trabalhadores nos estados da Bahia e Espírito Santo.

O acerto demorou quase dez horas. Num primeiro momento, os trabalhadores se negaram a dar os números das contas ou abrir uma como havia sido combinado na sexta-feira. Assim, os Auditores-Fiscais do Trabalho Maurício Gasparino José Márcio Brandão, Francisco Freitas e Alberto de Souza, com o auxílio da agente administrativa do MTb Márcia Maria Martins, tiveram que fazer a anotação de cada trabalhador, um a um, ontem à noite.

Auditores-Fiscais no mutirão para liberar os resgatados
Auditores-Fiscais no mutirão para liberar os resgatados

Em decorrência da recusa, foi necessário um aditivo ao TAC, pelo qual a empresa assumiu a obrigação de pagar com cheques os trabalhadores resgatados que não tinham conta bancária e foi reforçado o compromisso de fornecer alimentação e estadia a todos os trabalhadores até o destino final.

Isso porque houve um boato de que o ônibus fretado pela   Thenosflorestal os deixariam há 200 quilômetros de casa e a princípio, se negava a pagar a refeição deles na volta para casa. Pelo TAC a multa pelo descumprimento das obrigações será de R$ 3.000,00 (três mil reais) por trabalhador.

Trabalhadores recebem CT e guias do Seguro Desemprego
Trabalhadores recebem CT e guias do Seguro Desemprego

Um segundo TAC que seria proposto assinado apenas pelo representante da empresa Construflora, previa obrigações no sentido de garantir a integridade dos trabalhadores e as condições adequadas do meio ambiente de trabalho nas futuras contratações. Dentre as obrigações a empresa deverá realizar  exames médicos admissional, periódico e demissional em todos os empregados, elaborar e implementar o Gerenciamento de Riscos, bem como Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional, proporcionar capacitação sobre prevenção de acidentes, fornecer gratuitamente Equipamentos de Proteção Individual (EPI)e disponibilizar alojamentos adequados com água potável,  camas, colchões e roupas de cama condizentes com o clima local, além de espaços decentes para refeições, instalações sanitárias e preparo de alimentos, tudo de acordo com o que determina a Lei. A multa por obrigação descumprida é de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Todavia o proprietário da empresa não compareceu ao Ministério do Trabalho, como havia sido acordado, inclusive para providenciar alterações necessárias nas CTPS dos trabalhadores, que receberam uma certidão assinada pelos auditores fiscais para possibilitar o recebimento de seguro desemprego especial a que têm direito em razão da condição análoga a de escravo em que foram encontrados. O MPT concedeu o prazo de 24 horas para o comparecimento do empregador para assinatura do novo TAC. Não comparecendo a empresa no prazo concedido, o MPT ajuizará Ação Civil Pública em face da empresa Construflora, com vistas a assegurar o cumprimento integral da legislação trabalhista.

Quanto às demais empresas identificadas pela fiscalização do trabalho, o MPT avaliará suas responsabilidades e adotará, em breve, as providências administrativas e judiciais porventura cabíveis.

Embarque para casa depois de um mês em situação análoga à escravidão
Embarque para casa depois de um mês em situação análoga à escravidão

Entenda o caso:

Os trabalhadores foram aliciados para a extração de madeira de Pinus no Município de Rancho Queimado, na serra catarinense. Eles estavam há cerca de um mês na Fazenda Campinho, vivendo em condições degradantes, sem contrato de trabalho formalizado, com suas carteiras de trabalho retidas, e sem receber salários. Foram resgatados por meio de uma força tarefa composta pelo Ministério Público do Trabalho de Santa Catarina, Ministério do Trabalho e Polícia Rodoviária Federal no dia 03 de maio.  

De acordo com a denúncia apurada pelo MPT, eles chegaram ao estado catarinense por uma cadeia de envolvidos na contratação. O escritório Kalckmann Advogados, localizado em Lages, é o proprietário das terras. As árvores de pinus foram compradas por Márcio Ribeiro Lima ME, que teria contratado a empresa Thenosflorestal Infraestrutura e Logística Florestal Ltda para fazer o corte, que por sua vez subcontratou a Construflora Serviços Ltda, responsável por arregimentar os trabalhadores.

Segundo relato dos resgatados, eles deixaram suas cidades de origem, São Mateus no Espírito Santo e Nova Viçosa na Bahia, com a proposta de trabalho para a extração de madeira em São Paulo e, chegando lá, foram informados de problemas na propriedade paulista e trazidos para Santa Catarina onde receberiam entre R$ 2.700,00 e R$ 3.000,00.

O Ministério do Trabalho apurou que o transporte dos empregados de seu local de origem ocorreu de forma irregular, sem prévio registro em Carteira de Trabalho, realização de exames admissionais, e sem emissão de certidão declaratória de transporte, configurando aliciamento de trabalhadores.


Ao chegar em Rancho Queimado, foram alojados numa casa sem móveis, camas, ou mesmo água potável, carente de qualquer condição digna de moradia. Os trabalhadores relataram que passaram frio, já que não foram disponibilizados cobertores ou qualquer tipo de roupa de cama. Alguns deles utilizavam pedaços de espuma como colchão.

Os Auditores-Fiscais do Trabalho José Márcio Brandão, Maurício Gasparino e Francisco Freitas inspecionaram também a frente de trabalho, onde era realizada a extração da madeira. O local foi interditado após constatação de que não havia qualquer tipo de instalação sanitária, espaço adequado para refeição ou disponibilização de água potável. As motosserras utilizadas, de propriedade dos próprios empregados, não contavam com os dispositivos de segurança necessários, e o empregador não disponibilizou equipamentos de proteção individual (EPI). “

Os empregados chegaram a fazer o corte de pinus durante nove dias, mas os donos da terra, sob alegação de não receberem o dinheiro da venda das árvores mandaram as empresas cancelarem a extração e, sem recursos para honrar seus compromissos, deixaram os trabalhadores sem dinheiro, alojamento adequado e praticamente sem comida por quase um mês.

Álbum de fotos do acerto

Fonte:Assessoria de Comunicação Social MPT-SC

Coordenação: Fátima Reis

Estagiária: Eduarda Hillebrandt

prt12.ascom@mpt.mp.br

(48) 32519913 / (48) 999612861

Publicadoem 10/05/2018

 

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